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Writer's pictureJanayna Velozo

Design Thinking: Para além das soluções digitais...



Um dos maiores orgulhos que tenho na vida é de ter co-criado o Programa Ganhe o Mundo, junto com uma equipe sensacional de mulheres (e um homem) que genuinamente enxergavam a existência de um caminho através da educação. Foram 6 anos de um trabalho intenso, em que preparamos mais de 50 mil estudantes das escolas públicas estaduais em uma segunda língua e enviamos mais de 8mil pra fazer intercâmbio fora do Brasil por um semestre letivo. Cuidar de cada um deles era a prioridade.


Gostaria de poder expressar o que se sente quando uma mãe anafalbeta, que trabalha 16h por dia como faxineira, lhe pega pelas duas mãos, no saguão do aeroporto dos Guararapes de Recife faltando 2h pro filho dela embarcar, lhe olha fundo com os olhos cheios de lágrimas e diz: "Esse é meu único filho Janayna, a única coisa que tenho na vida, cuida dele." Não era apenas uma vida, a dele. Eram gerações e gerações de dificuldade e luta e fome e impossibilidades, que estavam dentro daquele menino indo ao "estrangeiro" pela primeira vez. Só de estar naquele aeroporto ele já estava mudando a história de todas as gerações que o antecederam na vida. Ele era a própria história, em carne viva, sendo reescrita.


Quatro dias atrás, fui mentora de uma Oficina de Design Thinking para adolescentes do projeto NUCA, da UNICEF. O grupo que guiei de perto tinha um desafio: promover a educação para uma cidadania democrática. Gostaria de poder expressar o que senti ao ouvir uma das meninas pedindo por mais empatia do professor que dava falta, mesmo quando alguém chegava atrasado por causa atraso do ônibus da escola. Lembrei do filho da faxineira, que andava 1h pela estrada de terra até a parada do ônibus e passava mais 2h pra chegar na escola. Quantas vezes teria ele levado falta porque não chegou a tempo de estudar em uma escola que não consegue sequer enxergar a fome de mudança que ele tem? Ele usava seis horas do dia, só com a ida e a volta pra escola, pelo sonho de estudar. Quantas vezes não chegamos até eles?


Tenho participado de um ecossistema cada vez mais vivo e rico, que tem trazido discussões de como a tecnologia e a inovação pode mudar o mundo pra melhor e solucionar os problemas das pessoas. De quais pessoas estamos falando? Será que estamos pensando no filho da faxineira que levei pra Nova Zelândia? As muitas palestras e oficinas que tenho participado nos últimos meses são gratuitas. Gratuitas. Qualquer pessoa da cidade poderia estar ali, mas sempre encontro as mesmas pessoas. Onde estão as outras? As que podem falar dos desafios de se vender chiclete na barraquinha da esquina? Os engenheiros que perderam mercado e passaram a trabalhar como Uber? As mães com seus filhos pulando de cadeira em cadeira enquanto se fala sobre empreendedorismo feminino? Os que não teriam condições de aprender se não fosse a gratuidade de eventos como esses? Será que eles sabem que esses eventos acontecem? Estamos dando visibilidade, acesso e voz a essas pessoas?


O objetivo da nossa mentoria na UNICEF era ensinar um jeito de pensar estruturado focado nas pessoas, para que os adolescentes que vieram de todos os cantos do Estado possam replicar nas suas cidades, e coletivamente gerar soluções com tantos outros que não estavam lá. Não se tratava de quem tinha a melhor idéia, mas como poderíamos, juntos, melhorar um pouco as coisas. Não se tratava de uma competição, mas de um fazer coletivo, de um mutirão de gente pensando junto, fazendo junto. Não se tratava de criar mais um aplicativo, dos mais de 6mil que são lançados por dia no Google Play. Se tratava de conectar pessoas usando a maior tecnologia já criada pelo ser humano: a linguagem. A conexão era no mundo físico, onde o tom de voz, o toque, o olhar e o estar junto, permite incluir os 40% da população que não têm acesso à internet.


Minha imensa gratidão a Arthur Braga, do Espaço Ceça, e a Leonardo Lima, do LOUCO, pela oportunidade de, mais uma vez, quebrar as correntes do pensar, dar a luz a interações outras... e fazer brotar sementes.

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